André Lucirton Costa*
alcosta@usp.br
Antonio Justino da Silva **
Não houve incêndio no Campus USP de Ribeirão Preto no ano que a data de 24 de agosto de 2024 ficou marcada como o início de grande quantidade de incêndios simultâneos que desencadeou vários e generalizados focos que causaram devastação na cidade, uma tragédia histórica sem precedentes. Com 586 hectares de sua área total, uma significativa parte de áreas verdes, sendo cerca de 29% regulamentadas como Reservas Ecológicas. Grande extensão vulnerável a incêndios, cuja vizinhança são bairros da cidade, estradas, hospitais e estruturas urbanas com grande movimentação de pessoas, fluxo de veículos e trânsitos, agricultura de produção em massa como vizinhança: fazenda produtora de cana de açúcar. Não se deve ao acaso a ausência de incêndio, mas às ações administrativas, investimentos, articulações com órgãos e poderes locais, envolvimento da comunidade, numa ação contínua de pelo menos década de trabalho.
A Prefeitura do Campus em sucessivas gestões investiu em estrutura e pessoal para combate de incêndio, ações que tiveram marco o ano de 2011 (16/08/2011) quando um incêndio de grandes proporções queimou boa parte da vegetação, uma floresta e áreas verdes do campus e algumas estruturas científicas e de ensino, afetando pesquisas biológicas e um banco de reposição genética. A USP foi acionada pelo Ministério Público de São Paulo e respondeu com ações que levaram a um patamar muito mais seguro e mitigatório. Os investimentos e ações de prevenção e combate a incêndios estão registrados e documentados em processos administrativos aberto especificamente para esse fim (Processo nº 2011.1.1240.53.9) com envolvimento além do MP-SP, a Polícia Ambiental, a Polícia Militar, o Corpo de Bombeiros, o IBAMA, a Defesa Civil e vários órgãos internos da Universidade de São Paulo.
Várias ações foram feitas a partir de então, como a melhoria nas vias de acesso à floresta e à zona rural para facilitar o combate a focos de incêndios, cercamento, compra de tratores e grade aradora, realização de aceiros de 20 metros de largura em todo entorno do Campus, caixa d’água de combate a incêndios, bomba de recalque, tanque de água/espuma para combate rápido a focos de incêndios, abafadores e bombas costais, veículo de combate a incêndio com kits de produtos para espumas (mantidos em estoque). Contrato de empresa para manutenção das áreas verdes e da floresta. Duas torres de observação com equipamentos de última geração (Drone com alcance de 8km) ligados diretamente ao setor de Monitoramento da Guarda Universitária em sala de controle virtual e informatizada. Rondas periódicas com modernos sistemas de comunicação nos lugares críticos e posicionamento dos veículos prontos para uso para facilitar a locomoção em épocas de seca, hidrantes próximos à floresta.
Brigadas de incêndio em escalas de plantão, com treinamento em combate florestal trimestral e equipamentos de proteção individual. Ressalta-se a articulação com os órgãos de segurança, formando um canal direto com a Polícia Ambiental e Militar, com o Corpo de Bombeiros, as fazendas vizinhas que dão suporte para ajudar a debelar os princípios de incêndios. A polícia florestal faz vistorias anuais em períodos prévios à seca, com laudo de avaliação e sugestão de medidas no sistema de combate a incêndios florestais.
No ano de 2015 a floresta incendiada já tinha sido recuperada, não só com o plantio de árvores, mas na sua manutenção “até o fechamento das Copas” como atesta documento de procedimento de arquivamento do Ministério Público que teve como base relatórios do IBAMA e da Polícia Ambiental. A criação da floresta desde o início (nos anos 1980) até a atualidade é tema de documentário “Nossa Floresta” mostrando a criação de um importante banco genético da Mata Atlântica.
Ocorreram poucos incêndios depois de 2011, debelados e com consequências bem menores. Em 2017 se teve o último incêndio um pouco mais intenso, mesmo na seca de 2021 e em 2024 o Campus da USP passou ileso. Muitas pessoas, várias gestões mantiveram o propósito e os investimentos necessários à mitigação das consequências trágicas desses eventos. Os investimentos e recursos de combate são muitos menores do que as consequências do incêndio de 2011 para pesquisa, para a ciência e para o meio ambiente. As autoridades que cuidam da gestão ambiental do Estado e do Município precisam criar planos e ações, orientações e estrutura para que as organizações da sociedade possam lidar com situações desse tipo e preservar a natureza, patrimônios e a vida.
* Professor Titular da Faculdade de Economia Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto – FEARP/USP
** Vice-presidente da Comissão de Meio Ambiente do Campus da USP de Ribeirão Preto
Fonte: Tribuna